Da Educação – Parte 3

 

Relato de uma vivência escolar

 

Fui, por concurso de títulos e provas, diretor de escola público durante quinze anos, primeiro numa Escola Normal em Guaíra, no interior do Estado, onde, durante um ano, consegui reunir Prefeitura, entidades religiosas e comércio visando a restauração do prédio, pintura e iluminação. Não havia funcionários suficientes para a limpeza do prédio: os alunos, depois de um trabalho de conscientização educativa, assumiram a limpeza diária da sala de aula além de realizarem pinturas, pequenas reformas e conserto de carteiras. As normalistas não tinham sala especial para sua prática didática, elas foram orientadas a dar reforço a alunos com dificuldades de aprendizagem, a assistir alunos carentes da periferia urbana e a reforçar sua aprendizagem, e, sobretudo, a ajudar os pais a encontrar junto a órgãos públicos – postos de saúde, prefeitura, delegacia, igrejas (católicas, evangélicas, espíritas) meios de serem mais bem assistidos. Havia a situação de trabalhadores rurais que, por falta de uniforme, prendiam seus filhos dentro de barracos precários, sujos, sem a mínima assistência humana. As normalistas, futuras professoras, foram lançadas diretamente no redemoinho dos problemas sociais onde iriam atuar, libertas das ideologias sistêmicas das pedagogias modernas – que nada servem. Mantive na cidade durante uma semana um artista de obra plástica com o objetivo de passar sua experiência para os alunos e despertar neles o prazer da arte, apontando caminhos, possibilidades humanas para suas vidas.

Quando as experiências começaram a aparecer, me removo para São Paulo e assumo a direção numa das maiores escolas públicas da cidade, Albino César, no bairro do Tucuruvi. Deixei de lado uma experiência muito rica e optei por ficar próximo da Universidade de São Paulo e aprofundar estudos em mestrado e doutorado.

Albino César apresentava para mim enormes desafios. Primeiro, uma escola dividida em quatro períodos com uma média de novecentos alunos por turno; um quadro de mais de cem professores; laboratório de química dividido em três seções – almoxarife, sala de experimento e sala de auditório (abandonado); laboratório de física distribuído também em três seções (abandonado); laboratório de biologia (abandonado); auditório para mais de quatrocentos assentos (abandonado); piscina (abandonada); biblioteca onde se “depositavam” poucos livros; sala de ginástica olímpica (a única a funcionar muito bem); duas quadras esportivas – uma grande, outra pequena  usada como depósito de carteiras quebradas; um pequeno jardim, destruído para uso de estacionamento; as salas de aula apresentavam péssimo estado de conservação – algumas lousas quebradas, vidraças destruídas, banheiros encardidos e com poucos funcionários para limpeza. Acresce ainda um enorme terreno em aclive ao lado do teatro e que servia de depósito de lixo da escola incinerado todos os dias.

Como enfrentar todos esses problemas.

Felizmente a escola não havia ainda sofrido o impacto das mudanças que na década de sessenta foram programadas pelas políticas públicas da educação ao abrir escolas a toque de caixa e atender à demanda de alunos oriundos das classes populares.

O Albino César contava com um quadro de excelentes professores que propiciava o desenvolvimento de uma educação de qualidade. Na matemática contávamos com um quadro de cinco professores efetivos – um deles lecionava em ensino superior; cinco professores efetivos em língua portuguesa; três grandes desenhistas, promotores a cada dois anos de uma bienal de desenho e pintura, que atraiam grande público da comunidade para assistir seus trabalhos; um grupo de professores de ginástica, sendo um deles técnico da seleção de basquete do Estado, e outro promotor de ginástica olímpica  vencedor de várias competições promovidas pelo Estado; um professor de geografia efetivo, autor de livro didático com edição escolar que abrangia o país todo. Essa pequena amostra já é suficiente para mostrar que a escola tinha tudo para dar certo, apenas faltava introduzir, com a ajuda desses profissionais, uma forte direção, que significava: a) melhorar, com reformas efetivas, a estrutura do prédio; b) unir professores com o objetivo comum entre as disciplinas ao evitar   práticas isoladas de seus conteúdos; c) trazer efetivamente o aluno para dentro da escola ao convocá-lo para sua participação na reforma e conservação do prédio, na organização de movimentos culturais no que se refere às artes de um modo geral e aqueles que são possíveis fazer; d) convocar os pais para serem parceiros da educação de seus filhos; e) convidar artistas da área musical, das artes plásticas, escritores, poetas, escultores, líderes religiosos, para serem voluntários sócios da escola, enfim, transformar a escola num centro irradiador de uma educação integral, onde o ideal de beleza e o processo de  sensibilização do aluno são vitais para fomentar o gosto de aprender.

O que fazer?

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